sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A LIÇÃO DA DERROTA

Uma derrota nunca é agradável. Uma derrota por dois pontos de diferença - a selecção de Portugal de Sub-19 perdeu com a selecção da Bélgica do mesmo escalão por 13-11 - quando se dispôs do maior volume de jogo ou do maior número de oportunidades, num jogo longo - com 54% de tempo útil - com sequências suficientemente compridas para explorar desequilíbrios, é pior e o desagradável toma proporções superiores. 
Não é, de facto, nada agradável enfrentar a tradução da situação: não foram eles que ganharam, fomos nós que perdemos. E para uma equipa com pretensões, o desanimo deve ser maior pelo sentimento de oportunidade deitada fora.
Não vale a pena, sabe-se, chorar sobre leite derramado e se uma derrota é uma derrota, só para uma coisa poderá servir: para tirar ilações e permitir assim que se possa somar experiência, tornando mais eficazes futuras prestações competitivas.
Porque perderam os Sub-19 de Portugal?
Antes do mais porque a sua prestação - ao contrário da dos belgas - pouco ou nada assentou num colectivo, num espírito de equipa, numa atitude colectivamente ganhadora a fazer de cada minuto um objectivo idêntico para todas as cabeças dentro do campo como exigível num desporto colectivo de combate. Por mais do que uma vez, durante o jogo, me lembrei da frase, depois de uma vitória inesperada no Super Rugby, de Andries Strauss, capitão dos Kings: "O rugby é um jogo bizarro, o carácter vence o talento em qualquer altura." E foi isso que levou a Bélgica á vitória: o carácter de um colectivo, mais do que eficácia do seu jogo.
Do lado de Portugal, a pretensão individualista sobrepôs-se demasiadas vezes á tomada de decisão favorável ao colectivo, perdendo-se assim ensaios ou pontos.
Dois momentos decisivos demonstram essa postura: enquanto no banco se dizia "postes!" numa penalidade sobre o final de um jogo com a diferença de dois pontos no resultado, alguém dentro do campo decidiu pontapé-para-fora, deitando também fora uma oportunidade cara contra o risco de uma hipótese; no alinhamento que se seguiu, alguém dentro do campo, contrariando o sistema utilizado pela equipa e a anterior superioridade já demonstrada no rucking-maul, decidiu por um lançamento comprido quando o objectivo útil seria captar a bola - e que melhor sítio para o conseguir do que a frente? - e ir ao ensaio. Imaturidade?! Certamente mas totalmente indesculpável e sem valer no campo das desculpas  - os Sub-19 são jogadores adultos, não são mais meninos e já integram o escalão do "treinar para vencer". E quando o resultado conta, as decisões a tomar pertencem ao sistema da equipa, ao sistema treinado, não ao livre-arbítrio de uma qualquer importância. Se servir de lição para uma carreira...
Áreas críticas
Mas fora deste desperdício infantil de oportunidades, viram-se - apesar de alguma melhoria em relação ao jogo anterior - aspectos técnicos e tácticos que constituem áreas críticas que, marcando o rugby português, o impedem de atingir uma superior plataforma de resultados. E esta derrota terá de servir para reflectir sobre elas, encontrando soluções para resolver adequadamente os pontos críticos que possam transformar as acções.
Em duas ou três jogadas prevaleceu o individualismo da leitura parcial quando um passe bastaria para encontrar o companheiro no caminho da vitória. À vitória do colectivo preferiu-se o egoísmo da derrota. 
A opção ir ao chão a destempo prevaleceu na maioria das infiltrações - nesta mania da palavra mais repetida do rugby português e que faz do toque um sinal de queda - quebrando a continuidade e demonstrando a enorme dificuldade de jogar entre-linhas e, consequentemente, a também enorme dificuldade de criar desequilíbrios defensivos e atingir a zona depois-da-defesa  em situação de vantagem. E se a estas dificuldades juntarmos o atraso na formação efectiva do apoio - onde estavam, por exemplo, o 6 e 7 em cada saída do nº8? - estaremos em presença de uma área crítica que, se transformada para um apoio próximo e de abertura de linhas de passe, dará uma outra dimensão ofensiva à(s) equipa(s).
Mas provavelmente o pior problema a resolver - porque destrói as conquistas de bola conseguidas e as oportunidades construídas - na "construção" de jogadores capazes de se adaptarem ás circunstâncias do jogo e que joguem de acordo com aquilo que os adversários propõem, mostrando-se eficazes na resolução das situações que enfrentam, tem solução numa lei simples do jogo: o passe lateral só é eficaz quando se avança para fixar os defensores. Ou seja, fazer o passe longe da defesa, sem a atacar, significa passar a bola mais defensores para cima do companheiro, deixando que a defesa ocupe o espaço que parecia livre e lançando ao vento aquiloque parecia uma oportunidade explorável. E se existe, por qualquer razão relacionada com o movimento do jogo, espaço livre na largura do campo, esse espaço não pode ser desperdiçado - o que significa que é preciso segurar a defesa, interessá-la, para que não possa deslizar e multiplicar-se. E estas manobras têm que ser o bê-à-bá da natureza dos jogadores.
Não ter ganho este jogo retira-nos a possibilidade de acesso ao Junior World Rugby Trophy - o Mundial B de Sub-20 onde estivemos, no Chile e no final da época passada. Com esta derrota, num jogo em que mostrámos maior capacidade virtual do que o adversário, mostrámos também alguns dos pontos críticos que retiram eficácia ao rugby português e que precisam, no dia-a-dia dos treinos dos clubes, de ser transformados em ferramentas ao serviço da objectividade da marcação de pontos. Porque é disso que as vitórias vivem: da marcação de pontos!

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